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A REGULAMENTAÇÃO DO MERCADO DE CARBONO NO BRASIL

  • Foto do escritor: Francia & Carvalho Sociedade de Advogados
    Francia & Carvalho Sociedade de Advogados
  • 6 de jan.
  • 7 min de leitura

Introdução

Os primeiros debates sobre a compensação da emissão de gases de efeito estufa ocorreram em 1997, com a assinatura do Protocolo de Quioto que estabeleceu que os países tivessem uma cota máxima para emitir gases poluentes. Em 2015, foi criado um novo tratado Internacional, o Acordo de Paris, que veio para substituir o protocolo de Quioto. Essa discussão tem ganhado força e forma ao longo dos anos, à medida que as mudanças climáticas se tornam mais evidentes e severas.


Diante da necessidade de cumprir os acordos firmados em Paris, o Brasil passou a trabalhar em diversas metas desde 2016. Destacamos a última meta estabelecida na COP29, conferência do clima da ONU realizada em Baku, Azerbaijão, em novembro de 2024: “A Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) brasileira estabeleceu o compromisso de reduzir suas emissões líquidas de gases de efeito estufa em 59% a 67% até 2035, comparado aos níveis de 2005. Em termos absolutos, isso equivale a uma redução de emissões para alcançar entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas de CO2 equivalente em 2035. Esse compromisso permitirá ao Brasil avançar rumo à neutralidade climática até 2050, que é o objetivo de longo prazo do compromisso climático”. [1]


 Diante dessas metas e necessidades, em 12 de dezembro de 2024, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 15.042, de 11 de dezembro de 2024, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que estabelece as bases para a criação de um mercado regulado de carbono no Brasil.


Considerando que a regularização do carbono no país é um marco significativo, o escritório Francia & Carvalho Sociedade de Advogados, diante da nova lei e da dificuldade do público em associar a emissão de dióxido de carbono (CO₂) com o mercado de capitais, se propõe a esclarecer alguns pontos de maneira clara e compreensível, abordando seus objetivos, desafios e benefícios.


1)   O Que É O Mercado De Carbono E Sua Importância?

O mercado de carbono é uma ferramenta crucial para a precificação das emissões de gases responsáveis pelo aquecimento global. Seu objetivo principal é auxiliar o país no cumprimento de metas climáticas de redução de emissões. Para alcançar esse objetivo, é fundamental que empresas e indústrias avaliem tanto o impacto econômico do mercado de carbono quanto sua interação com o meio ambiente.

 

Frequentemente, as agendas econômicas e ambientais entram em conflito devido ao desafio de continuar produzindo, utilizando menos recursos naturais. No entanto, ambas são indispensáveis, e encontrar um equilíbrio entre elas é essencial, pois a redução das emissões de carbono e seus equivalentes na atmosfera é uma necessidade urgente. Nesse contexto, o mercado de carbono propõe recompensar esforços adicionais na redução de emissões, permitindo que quem ultrapassa suas metas estabelecidas gere um impacto ambiental positivo, que se traduz em benefícios econômicos.

 

A regulamentação do mercado de carbono no Brasil é essencial não só pelo impacto ambiental positivo, mas também para evitar prejuízos financeiros à indústria nacional. Países como Estados Unidos, México, Canadá, China e Japão já possuem regulamentações estabelecidas para o mercado de carbono, exigindo que transações comerciais atendam a esses requisitos ambientais. Portanto, alinhar as práticas do Brasil com as normas internacionais é crucial para manter sua competitividade global.

 

Em resumo, o mercado de carbono será um sistema supervisionado pelo governo, no qual empresas e indústrias terão cotas máximas permitidas ou licenciadas para emissão de gases. Assim, aquelas que emitirem menos do que a cota poderão vender a diferença, enquanto as que excederem a cota precisarão comprar essas sobras ou adquirir ativos que representem a remoção de gases.

 

2) Mercado Regulado E Mercado Voluntário

 

Para entender de maneira simples, podemos considerar duas formas econômicas de atribuir valor ao carbono: por meio de regulamentações ou de maneira voluntária.

 

Mercado regulado: O mercado regulado é aquele criado por meio de legislação que exige que certas atividades econômicas reduzam gradualmente suas emissões de GEE. Neste sistema, o Estado distribui "direitos" ou "permissões" de emissão de GEE às empresas envolvidas, até um limite predeterminado. Esses direitos são concedidos em quantidades decrescentes ao longo dos anos, assegurando uma redução previsível nas emissões de GEE pelas empresas.


O mercado regulado de carbono estabelece metas de GEE para as atividades econômicas abrangidas pela lei. Empresas que não atingirem suas metas de redução de emissões poderão comprar permissões de emissão, conhecidas como Cotas Brasileiras de Emissão (CBEs), de empresas que estiverem abaixo do limite[2]. Essa compra e venda de créditos de carbono entre empresas ou países é chamada de cap-and-trade. Cada unidade desses créditos é equiparável a 1 tonelada de CO².


Contudo, os setores que serão incluídos no sistema ainda não foram especificados. A proposta determina apenas que operadores de instalações e fontes que emitem mais de 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano estarão sujeitos à regulação.

 

Mercado voluntário:  No mercado de carbono voluntário, as empresas estabelecem metas para reduzir emissões por iniciativa própria e adquirem créditos de carbono de outras que já tenham alcançado essas metas. Porém, esses créditos deverão ser verificados por entidades independentes e credenciadas pelos órgãos gestor de SBCE. Essas entidades auditam e emitem os certificados, garantindo a credibilidade do sistema. É necessário comprovar a sua efetividade e seguir as regras para ter acesso a esse mercado.

 

3) Como Será A Implementação Do SBCE?

A implementação do SBCE será gradual e está dividida em cinco fases principais.

 

Fase 1 (12 a 24 meses)regulamentação inicial, criação do órgão gestor e definição dos setores que serão regulados. Nesse momento, serão definidos os detalhes operacionais do sistema e as bases jurídicas para o funcionamento do mercado.

Fase 2 (12 meses): operacionalização do sistema de monitoramento, relato e verificação (MRV) das emissões. As empresas terão de reportar suas emissões de forma padronizada, criando uma base de dados que permitirá a fiscalização do mercado.

Fase 3 (24 meses): início da obrigação de apresentar relatórios de emissões e planos de monitoramento, o que fornecerá os dados necessários para o primeiro Plano Nacional de Alocação (PNA).

Fase 4: início do primeiro ciclo de alocação de CBEs e operacionalização dos primeiros leilões. Será publicado o PNA, que definirá as regras de distribuição de cotas e o volume inicial disponível para o mercado. Nessa fase, as primeiras CBEs começam a ser emitidas e negociadas, com a participação das empresas reguladas.

Fase 5: implementação plena do mercado, com o primeiro leilão de CBEs e o início do mercado secundário, que permitirá negociações entre empresas. [2]

 

4) Desafios Do Mercado De Carbono

A aprovação do mercado de carbono representou um grande avanço, porém ainda há muito trabalho pela frente para torná-lo eficaz. O maior desafio da nova lei é criar uma estrutura eficiente para gerenciar esse processo. Além disso, as empresas enfrentarão o desafio de conhecer a sua própria realidade, realizando inventários detalhados para compreender a pegada de emissões que possuem atualmente. Além desses desafios, aqui estão outros obstáculos complexos identificados:


Complexidade do sistema: A lei exige um alto nível de conhecimento técnico.


Integridade dos processos: É essencial seguir as regras, garantir a qualidade dos projetos e comprovar a redução das emissões, o que exige investimento em tecnologia e consultoria especializada.


Estrutura: O sistema precisa ser robusto, com tecnologias avançadas, uma rede de avaliadores qualificada e um sistema de governança transparente.


Definições: Muitos detalhes ainda precisam ser definidos e as regras devem ser claras para garantir segurança jurídica para todos os envolvidos. Esse processo precisa ser participativo, envolvendo governos, empresas, produtores rurais e especialistas.


5) Porque O Setor Agropecuário Ficou De Fora Do SBCE?

Estabelece o Art. 1º, § 2º, da Lei 15.045, de 2024 que “para os fins desta Lei, a produção primária agropecuária, bem como os bens, as benfeitorias e a infraestrutura no interior de imóveis rurais a ela diretamente associados, não são considerados atividades, fontes ou instalações reguladas e não se submetem a obrigações impostas no âmbito do SBCE” [2].


O setor agropecuário é o segundo maior emissor de gases de efeito estufa no Brasil. Contudo, inicialmente, não terá que cumprir com as obrigações do SBCE. A “exclusão” é justificada pela dificuldade de medir as emissões do setor, dado que ainda não existem metodologias bem estabelecidas para esse controle. Dada a importância do tema, é essencial que haja um processo de aferição que garanta transparência e precisão. Sendo este mais um desafio na estruturação da lei aprovada.


6) Conclusão

Muitas empresas e indústrias prosperam utilizando os recursos naturais fornecidos gratuitamente pela natureza. Com o passar do tempo, os impactos econômicos dessas atividades tornam-se evidentes e acabam impondo custos à sociedade, afetando especialmente as comunidades mais carentes, devido às mudanças climáticas.


Neste contexto, a regulação do mercado de carbono ganha ainda mais importância e foco, pois, é necessário intervir para combater as mudanças climáticas. A lei de certa forma obrigará as grandes indústrias a repensarem suas formas de produção, as obrigando a buscar o uso de recursos renováveis.


O mercado de carbono não deve ser levado como uma questão política ou ideológica, mas como uma questão de sobrevivência. A lei busca conciliar a proteção ambiental com o desenvolvimento social.

O Brasil está tendo uma chance única de ser pioneiro neste setor, já que concentra 15% do potencial global de captura de carbono por meios naturais, com chances de atender a 48,7% da demanda global, de acordo com estudo realizado pela consultoria [3]. Mas para aproveitar essa oportunidade, é preciso garantir a compatibilidade do sistema brasileiro com os sistemas internacionais, para que os créditos gerados aqui sejam aceitos e reconhecidos em outros países.


Assim, o mercado de carbono não apenas visa cumprir um propósito climático, mas também se apresenta como uma ferramenta essencial para acelerar uma política climática mais eficaz. É fundamental que a comunicação sobre esse tema seja clara e acessível, permitindo que todos compreendam como ele funciona e as oportunidades que oferece.


Portanto, o mercado de carbono, apesar de complexo, é repleto de possibilidades para o desenvolvimento sustentável e a preservação do meio ambiente. É uma peça vital para a nossa sobrevivência e um passo necessário para garantir um futuro mais equilibrado para as próximas gerações.


Gabriela Carvalho

Referências:

[1] Brasil apresenta sua nova meta climática alinhada à Missão 1,5. Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Disponível em: <https://www.gov.br/mdic/pt-br/assuntos/noticias/2024/novembro/brasil-apresenta-sua-nova-meta-climatica-alinhada-a-missao-1- 5#:~:text=A%20segunda%20Contribui%C3%A7%C3%A3o%20Nacionalmente%20Determinada, compara%C3%A7%C3%A3o%20aos%20n%C3%ADveis%20de%202005>. Acesso em: 16 dez. 2024.

 [2] Sancionada a lei que estabelece as bases para um mercado regulado de carbono no Brasil. Ministério da Fazenda. Disponível em: <https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2024/dezembro/Sancionada-a-lei-que-estabelece-as-bases-para-um-mercado-regulado-de-carbono-no-Brasil>. Acesso em: 16 dez. 2024.

[3] Brasil pode liderar mercado de carbono no mundo; previsão é que setor movimente US$ 50 bi até 2030. Valor Econômico. Disponível em: <https://valor.globo.com/conteudo-de-marca/b3/financas-sustentaveis/noticia/2024/03/06/brasil-pode-liderar-mercado-de-carbono-no-mundo-previsao-e-que-setor-movimente-us-50-bi-ate-2030.ghtml>. Acesso em: 19 dez. 2024.

[4] Lei nº 15.042, de 2024. Presidência da República. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2024/lei/L15042.htm>. Acesso em: 18 dez. 2024.

 [5] Mercado voluntário de carbono tem potencial gigantesco no Brasil. McKinsey & Company. Disponível em: <https://www.mckinsey.com.br/our-insights/all-insights/mercado-voluntario-de-carbono-tem-potencial-gigantesco-no-brasil>. Acesso em: 17 dez. 2024.

[6] Mercado de carbono. Amcham Brasil. Disponível em: <https://www.amcham.com.br/blog/mercado-de-carbono>. Acesso em: 19 dez. 2024.

 

 

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