top of page

Economia circular: Do Descarte à Regeneração.

  • Foto do escritor: Francia & Carvalho Sociedade de Advogados
    Francia & Carvalho Sociedade de Advogados
  • 21 de jan.
  • 9 min de leitura

A economia global tem sido historicamente figurado em um modelo linear de produção, centrado na extração de recursos naturais, produção, consumo de bens e posterior descarte de resíduos. No entanto, o impacto ambiental desse modelo tem se mostrado não só negativo, mas irreversível. Esse paradigma econômico falha em considerar o esgotamento dos recursos naturais, o aumento da poluição e a inadequada gestão de resíduos, operando sob a premissa equivocada de que o descarte na natureza é um processo normal.


Emerge um novo modelo econômico como resposta às urgentes discussões sobre mudanças climáticas e sustentabilidade: a economia circular. Este modelo propõe uma transformação no paradigma em relação à economia linear, visando um desenvolvimento mais equilibrado e sustentável, respeitando os limites do planeta e promovendo a prosperidade para as gerações de hoje e do futuro.


O Escritório Francia e Carvalho Sociedade de Advogados convida à reflexão sobre o tema. Considerando que a difusão do conceito de economia circular na sociedade ainda é limitada e que sua implementação eficaz depende de uma evolução educacional e cultural no consumo, bem como de aspectos jurídicos fundamentais para a sua promoção no Brasil, este artigo destaca a relevância de uma legislação atualizada e abrangente que suporte as práticas circulares, preenchendo as lacunas ainda presentes no ordenamento jurídico brasileiro.


Assim, abordaremos pontos fundamentais e perspectivas pertinentes à economia circular, conforme discutido no tema do eixo ambiental da norma da ABNT PR 2030.

 

1)      O Que é a Economia Circular?

Economia circular: “sistema econômico que utiliza uma abordagem sistêmica para manter um fluxo circular de recursos, ao recuperar, reter ou agregar valor a esses recursos, ao mesmo tempo em que contribui para o desenvolvimento sustentável" (ABNT NBR ISO 59004:2024, item 3.1.1) [11].

Figura 1: Demonstração de Economia Circular. Fonte: Grupo Muda
Figura 1: Demonstração de Economia Circular. Fonte: Grupo Muda

A economia circular tem ganhado cada vez mais destaque em debates globais sobre sustentabilidade, propiciando a criação de políticas públicas, iniciativas empresariais inovadoras e o desenvolvimento de tecnologias avançadas para a implementação de modelos circulares. A norma ISO 59004, publicada em 2021, apresenta princípios-chave interdependentes e complementares que devem ser considerados durante a transição para uma economia circular. Esses princípios incluem a eliminação de qualquer tipo de resíduo e poluição, a circulação de materiais e produtos o maior número de vezes possível e a regeneração da natureza, devolvendo a ela tudo o que nos oferece.


A ênfase na prevenção da geração de resíduos é um dos pilares da Economia Circular. Isso implica repensar o design de produtos, os processos de produção e os modelos de consumo, buscando minimizar o desperdício em todas as etapas.


Economia Circular busca romper com o conceito tradicional de "resíduo", transformando o que era considerado lixo em um recurso valioso a ser reintegrado na economia, contribuindo para a sustentabilidade do planeta.


2)      Reciclagem x Economia Circular

Para prosseguirmos na análise do tema, é fundamental ressaltar que a economia circular e a reciclagem são conceitos distintos, cada qual com suas abordagens e objetivos específicos no gerenciamento de recursos e resíduos.


Reciclagem: É o processo de transformar materiais usados que seriam descartados em novos produtos. O principal objetivo da reciclagem é diminuir a quantidade de resíduos no meio ambiente e reutilizar matérias-primas.


Economia Circular: Engloba a reciclagem, mas vai além dela, só é reciclado quando não se pode mais reutilizar o produto. Focada em minimizar o desperdício e otimizar o uso dos recursos, a economia circular tem como objetivo "fechar o ciclo" de vida dos produtos. Isso não só inclui reciclar, mas também envolve reduzir, reusar, consertar e remanufaturar produtos. É um sistema no qual produtos, componentes e materiais sejam utilizados pelo maior tempo possível.


Adentrando no tema de reciclagem, é de suma importância falarmos dos catadores que desempenham um papel fundamental na economia circular, especialmente no Brasil. Mesmo enfrentando frequentemente a marginalização, eles são protagonistas na recuperação de recursos ao coletar e separar materiais que seriam descartados, reintroduzindo-os na cadeia produtiva.


A importância dos catadores se manifesta em diversos aspectos:  A coleta proporciona trabalho e renda para muitas pessoas em situações vulneráveis, o que ajuda a diminuir a pobreza e promover a dignidade. Ao desviar os materiais recicláveis dos aterros sanitários, os catadores reduzem a poluição, conservam os recursos naturais e auxiliam na mitigação das mudanças climáticas. Além disso, desempenham um papel essencial na cadeia de reciclagem, conectando os geradores de resíduos com empresas que utilizam materiais reciclados. Seu conhecimento prático sobre materiais recicláveis permite que atuem em áreas muitas vezes não atendidas pelos serviços de coleta tradicionais.


 Contudo, os catadores encontram obstáculos significativos em seu trabalho, como a ausência de reconhecimento formal, as condições de trabalho desfavoráveis e a dificuldade em acessar políticas públicas de suporte. Reconhecer e valorizar o papel dos catadores é essencial para a construção de uma economia circular mais justa, inclusiva e sustentável no Brasil.


3)      Economia Circular e Lixo Eletrônico

O Brasil figura entre os maiores produtores de resíduos eletrônicos no cenário global. A falta de informação e conhecimento sobre o tema é notória. No ritmo acelerado de nossa era tecnológica, as novas inovações têm impactado profundamente nossos hábitos de trabalho, aprendizado e comunicação. Contudo, este progresso acarreta um aumento significativo na geração de lixo eletrônico, que, por sua vez, provoca diversos impactos ambientais.


A conscientização sobre o descarte adequado de resíduos eletrônicos deve começar no âmbito doméstico, abrangendo desde a disposição de uma simples pilha até eletrodomésticos complexos como televisores. No Brasil, a ausência de uma política eficaz para o manejo e descarte de lixo eletrônico é evidente. Entretanto, o lixo eletrônico possui um imenso valor; quando reciclado corretamente, se transforma em matéria-prima para a fabricação de novos produtos.


É imperativo que as empresas responsáveis pelo descarte de lixo eletrônico adotem práticas rigorosas de proteção de dados contidos em dispositivos como telefones, computadores e pendrives, etc. Além disso, é crucial que estas empresas implementem um controle eficiente para assegurar que a origem dos produtos recebidos seja lícita, evitando, assim, a prática criminosa de receptação de bens. O cumprimento destas medidas não apenas mitiga riscos legais, mas também reforça a integridade operacional e a conformidade com as normas de proteção de dados e combate ao crime.


4)      Benefícios e Desafios da Economia Circular


É indiscutível que o benefício mais significativo da economia circular reside na preservação ambiental. Contudo, a economia circular tem sido objeto de debate nas pautas estratégicas das principais empresas, bem como nas decisões de fundos de investimentos, que agora são guiadas por princípios ESG (Ambiental, Social e Governança), ou seja, investindo não apenas com o objetivo de gerar lucro. A economia circular não nos relaciona apenas aos problemas ambientais.


Adicionalmente, é crucial que a governança corporativa seja receptiva às inovações, compreendendo e incorporando os conceitos da economia circular, a fim de tornar o negócio mais estratégico e alinhado às demandas contemporâneas.


Nota-se que o nome é ECONOMIA circular, isso traz a ideia de economia circulando, no nosso ponto de vista isso é positivo uma vez que o lucro também é essencial.   As pessoas estão cada vez mais percebendo que a economia circular não é apenas uma forma de preservar o meio ambiente, mas também uma oportunidade de negócio que gera impactos positivos, seja ele social, seja ambiental, mas que também traz dinheiro para as empresas e gera mais empregos, as empresas estão transformando seus produtos nos “pós vida” em serviços.


A economia circular ajuda as empresas a economizar dinheiro ao usar menos matérias-primas, energia e ao diminuir custos com lixo. Reutilizar, fabricar novamente e reciclar materiais possibilita criar novos produtos e serviços, abrindo novos mercados e aumentando os lucros.


A economia circular fortalece a resiliência dos sistemas econômicos ao diminuir a dependência de matérias-primas virgens e ao mitigar a vulnerabilidade às variações de preços. A cooperação entre diversos atores, incluindo empresas, governos e consumidores, é essencial. A transição para um modelo de negócios circular exige que as empresas repensem suas práticas. É essencial que os produtos sejam projetados com foco na reutilização, reparação, remanufatura e reciclagem. Além disso, a implementação de sistemas eficientes de logística reversa é crucial para a recuperação de materiais e produtos após o uso. As empresas também precisam adotar uma perspectiva ampla e de longo prazo, buscando a criação de valor compartilhado e incentivando a colaboração entre todos os stakeholders envolvidos.


Durante o estudo para o desenvolvimento deste artigo, o principal desafio identificado para o funcionamento da economia circular foi a necessidade de uma mudança na cultura do consumo no Brasil e no mundo. Embora não faltem discussões e evidências quanto à necessidade da circularidade, o que falta é esforço e políticas públicas educativas para consciencializar sobre a sua importância. É imprescindível que essa consciência ambiental seja discutida e enraizada desde cedo nas escolas e nas comunidades. Grande parte da sociedade desconhece o conceito de economia circular ou o confunde com reciclagem, que, por si só, não é suficiente.


A necessidade de uma nova perspectiva jurídica torna-se imperativa diante dos desafios e oportunidades inerentes à implementação da economia circular. Em 2010, foi sancionada a Lei 12.305/2010, que estabeleceu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, definindo a responsabilidade compartilhada entre fabricantes, importadores, distribuidores e consumidores no que tange à destinação adequada dos produtos após o consumo.


O Direito desempenha um papel crucial na promoção da economia circular, podendo atuar em diferentes frentes como por exemplo: A regulamentação de produtos estabelecendo requisitos mínimos de durabilidade; criar normas específicas para o uso de substâncias químicas garantindo a segurança dos materiais em diferentes ciclos de vida; promover a legislação para valorização de resíduos através da reciclagem, compostagem e outras formas de tratamento, minimizando o descarte em aterros.

 

A economia circular apresenta-se como um modelo de desenvolvimento mais sustentável e resiliente, com potencial para gerar benefícios econômicos, sociais e ambientais. A construção de um arcabouço jurídico sólido e a colaboração entre os diferentes atores da sociedade são essenciais para impulsionar a transição para esse novo paradigma.


É necessário que o Direito acompanhe as inovações e os desafios da economia circular, criando um ambiente propício à implementação de práticas circulares e à construção de um futuro mais sustentável.  Uma vez que os processos burocráticos e a complexidade das licenças e autorizações para atividades de Economia Circular desestimulam investimentos e dificultam a criação de novos negócios. É essencial que a regulamentação seja flexível e adaptável, atendendo às diversas realidades e necessidades dos setores, sem comprometer a segurança ambiental e a saúde pública.


5)      Conclusão

A economia circular emerge como um modelo indispensável para enfrentar os desafios ambientais causados pelo tradicional modelo linear de produção. Considerada a importância da sustentabilidade nas legislações contemporâneas, a implementação deste novo paradigma depende essencialmente de uma reformulação jurídica que promova a responsabilidade compartilhada e sancione práticas não sustentáveis.


O Direito deve desempenhar um papel ativo na promoção da economia circular, criando leis e regulamentações que incentivem a reutilização, reciclagem e recuperação de materiais. A Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010) é um passo importante nesse caminho, mas é preciso evoluir ainda mais, expandindo e aperfeiçoando as normativas para cobrir lacunas e fortalecer a fiscalização.


A adoção do modelo de economia circular impulsiona uma mudança cultural, que deve ser acompanhada de uma sólida base educacional e de políticas públicas voltadas para a conscientização ambiental. Esta transformação é necessária não só para reduzir o esgotamento dos recursos naturais e a poluição, mas também para fomentar uma economia mais resiliente e sustentável.


Assim, uma crítica final é que, embora o avanço jurídico seja essencial, sua eficácia dependerá de sua sincronia com iniciativas sociais e empresariais, garantindo que todos os atores estejam comprometidos e engajados na transição para um modelo econômico que respeite os limites do planeta e promova um futuro próspero para as próximas gerações.



Gabriela Carvalho

ree



Referências:

[1] BRASIL. Fazenda. Acesso à Informação: Economia Circular. Disponível em: <https://www.gov.br/fazenda/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/transformacao-ecologica/economia-circular>. Acesso em: 12 jan. 2025.

[2] ECYCLE. Economia Circular. Disponível em: <https://www.ecycle.com.br/economia-circular/>. Acesso em: 12 jan. 2025.

[3] IDEIA CIRCULAR. Economia Circular. Disponível em: <https://ideiacircular.com/economia-circular/>. Acesso em: 13 jan. 2025.

[4] BENATTI, G.; FARIAS, B.G.; BOEIRA, L. Economia Circular1: Respostas Rápidas2 para Governos. Evidências, Desafios e Caminhos Possíveis. São Paulo: Instituto Veredas, 2024.

[5] Fontgalland, Isabel Lausanne Economia circular e consumo sustentável [livro eletrônico] / Isabel Lausanne Fontgalland. –– Campina Grande : Editora Amplla, 2022.

[6] Pimentel, Andréa Bueno. Economia circular / Andréa Bueno Pimentel, Anastácia Fontanetti. – São Carlos : UFSCar/CPOI, 2020. 10 p. (Coleção - Agroecologia em Foco).

[7] SEBRAE. Economia Circular - Boas Práticas. Disponível em: <https://cms.mt.sebrae.com.br/storage/sites/e50b7e84-deb0-483b-823b-eacbbeaa586a/document/85080bfc-d7fb-4cbc-938b-17f2a67cb141.pdf>. Acesso em: 14 jan. 2025.

[8] FGVces. Economia Circular nas cadeias de valor brasileiras: desafios e oportunidades para promover a Economia Circular nas cadeias de energia e de telecomunicações. São Paulo, SP: Centro de Estudos em Sustentabilidade/ EAESP FGV, 2024. 99 p.

[9] Economia circular/ Autores : Ana Maria R. C. de Castro,Júlia Fonseca C.Andrade, Cleyse Kelly B. Nunes... [et al.].--São Carlos :EESC-USP, 2023.

[10] GRUPO MUDA. Economia Circular. Disponível em: <https://grupomuda.com/economia-circular/>. Acesso em: 14 jan. 2025.

[11] Confederação Nacional da Indústria. Economia circular na prática: guia de implementação segundo a série ABNT NBR ISO 59000 / Confederação Nacional da Indústria, Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. – Brasília : CNI, 2024. 50 p. : il.

[12] BRASIL. Lei n. 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso em: 14 jan. 2025.

 

Francia & Carvalho Sociedade de Advogados

Fique atualizado (a)

Cadastre seu email e receba nossos informativos

Email cadastrado com sucesso!

Francia & Carvalho Sociedade de Advogados

Rua da Bahia, nº 1148, sala 1028, 10ª andar Belo Horizonte/MG

CEP:30160-906.

​Francia & Carvalho Sociedade de Advogados é inscrita na OAB/MG sob o nº 7821 e CNPJ 31.689.808/0001-51

Contato/Endereço 

(31) 9 8407-3230

(31) 9 8407-3230

Fale com um especialista

Mensagem enviada!

© 2024 Todos os direitos reservados a  - Francia & Carvalho Sociedade de Advogados.

bottom of page